Evento TUMI aborda desafios e avanços na adoção de ônibus elétricos no Brasil 

Parte da programação do Congresso Mundial do ICLEI 2024 em São Paulo, Evento TUMI falou sobre a transição justa para um sistema de transporte coletivo inclusivo e sustentável

Sede do Congresso Mundial do ICLEI 2024, a cidade de São Paulo recebeu na última semana mais de 1.500 líderes urbanos globais de 95 países para trocar experiências sobre ações locais relacionadas à emergência climática, adaptação e resiliência das cidades. A programação contou com o Evento TUMI – sigla em inglês para a Iniciativa Transformadora de Mobilidade Urbana. O projeto iniciado há quase 4 anos está ajudando uma rede de cidades no Sul Global a acelerar a transição justa para a eletrificação do transporte coletivo.

Participaram do Evento TUMI representantes de secretarias de mobilidade e transportes de diversas cidades brasileiras, bem como do Ministério das Cidades do Brasil, além de membros das entidades e redes de cidades parceiras, como a própria organizadora do evento, ICLEI – rede global de governos locais e regionais que influencia políticas de sustentabilidade e impulsiona ações locais. 

Entre os desafios iniciais e os avanços no processo de tornar o transporte coletivo mais inclusivo, ao mesmo tempo que se reduz as emissões de gases de efeito estufa e material poluente, está o acesso à aquisição de ônibus elétricos. “Num esforço conjunto de vários parceiros estamos superando a questão do que vem antes ‘o ovo ou a galinha’ nesse segmento: não tem demanda de ônibus elétrico, mas as cidades não demandam porque quase não tem ônibus elétricos no mercado”, disse Jens Giersdorf, gerente da TUMI na GIZ – Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit, agência de cooperação técnica ligada ao Ministério para Cooperação Econômica e Desenvolvimento do governo alemão, entidade iniciadora e financiadora do projeto.

“Agora com o Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), o Brasil está no momento de dar escala a essa tecnologia, e também a outro elemento super importante: a transformação do mercado de trabalho, com inclusão social e de gênero junto dessa transformação tecnológica”, concluiu Jens. 

Como parceiras locais que formam a TUMI estão ICLEI, WRI, ITDP, UITP e C40, entidades e redes de cidades ligadas à sustentabilidade e aos transportes, que montaram uma rede de colaboração para apoiar representantes municipais no avanço da adoção de ônibus elétricos. A ajuda tem sido particularmente importante no pós-pandemia, enquanto as cidades se esforçam para recuperar a quantidade de passageiros perdida para veículos particulares e serviços de aplicativo. 

Não poluentes, sem ruídos e mais confortáveis, os ônibus elétricos são uma alternativa mais segura para todas as pessoas e inclusive para atrair novos passageiros. “Temos de buscar sustentabilidade na mobilidade. Muito além da descarbonização, esse grande desafio passa permanentemente pela busca da retomada do transporte coletivo como uma matriz viável”, disse André Aranha, assessor executivo da presidência da Empresa Pública Municipal de Desenvolvimento de Campinas, uma das cinco cidades deep dive, ou seja, de acompanhamento mais aprofundado da TUMI no Brasil. 

De acordo com o executivo, hoje a participação do transporte público em Campinas é inferior a 25% na matriz de mobilidade urbana da cidade. Como ocorreu em outros locais do mundo, a procura pelo uso de ônibus caiu durante a pandemia, e a demanda ainda não foi recuperada. “Nossas iniciativas para reverter essa tendência desafiadora de perda de demanda no longo prazo passam pelo aprimoramento da qualidade do serviço”, ressaltou. 

No final de um contrato de 20 anos de concessão, a cidade de Campinas tentou 4 vezes nos últimos meses lançar uma nova licitação, sem receber qualquer proposta do mercado. Em consulta pública, descobriu que o principal motivo era porque a prefeitura estava exigindo dos operadores a aquisição dos ônibus elétricos, que possuem um custo inicial cerca de 3 vezes acima do valor do ônibus a diesel, além da infraestrutura de recarga. 



 
Novo PAC


Com a ajuda da TUMI, a prefeitura elaborou uma nova modelagem de negócio para a licitação do serviço de transporte coletivo, na qual quase um terço do investimento passa a ser público. Assim, foi contemplada com 100% dos recursos que solicitou ao Novo PAC. “Agora estamos fazendo com ajuda da TUMI o estudo para a adaptação da rede de distribuição de energia para a operação dos ônibus. E já entendemos que com os elétricos sendo a maior parte da operação do corredor do BRT a gente terá a oportunidade maior de redução de emissões”, detalhou André Aranha. 

Foi a primeira vez que o PAC incluiu a renovação de frota de ônibus, e pretende disponibilizar R$ 48,8 bilhões em investimentos em mobilidade urbana para cidades de médio e grande porte, o que inclui também infraestrutura de metrô, trem, VLT e BRT, bem como corredores, faixas exclusivas, centros de controle operacional, terminais e estações, incluindo infraestrutura para ciclistas e pedestres. 

“A demanda que a gente recebeu de estados, municípios e operadores privados impressiona, e foi bastante interessante ver esse apetite para renovação de frota a partir do ônibus elétrico”, disse Paula Coelho da Nóbrega, coordenadora-geral do Planejamento da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades do Brasil. “Na primeira etapa, disponibilizamos R$ 3 bilhões e recebemos a demanda de R$ 14 bilhões, então conseguimos negociar com o BNDES para atender a todas as solicitações através de financiamento”, completou.

Assim, nessa primeira fase, o PAC chegou a R$ 10,6 bilhões a serem disponibilizados para 77 projetos de 66 Municípios em 19 estados, contemplando a aquisição de 2.296 ônibus elétricos, incluindo a infraestrutura de recarga. A coordenadora ressaltou que cada município está num momento de maturidade e velocidade diferente na adoção da tecnologia, e o Ministério das Cidades recebeu diferentes modelos de propostas: aquisição de frota pública, acordo por comodato, entre outros formatos. 

São José dos Campos, por exemplo, que participa da rede de cidades mentoradas pela TUMI no Brasil, está utilizando o modelo de aluguel porque foi a solução viável que encontrou para o momento. Mas poderá substituí-los ou somá-los a 12 novos ônibus elétricos que irá adquirir com recursos do PAC. 

A cidade tem atualmente 330 ônibus a diesel e 12 elétricos, mas está planejando ter uma frota 100% elétrica com 412 ônibus. Em maio, iniciou a integração do sistema coletivo com o aluguel de bicicletas – atualmente com 120 unidades, com a pretensão de chegar a 1.200 bicicletas, além de outros modais integrados, como patinetes, táxis e vans. 

Inclusão

Além da disponibilidade de acesso e aquisição de ônibus elétricos, aproveitar a transição da matriz energética do transporte coletivo para torná-lo mais inclusivo para todas as pessoas é outro desafio que vem sendo cuidado. “Não há possibilidade de a gente falar em algo que seja sustentável, que não esteja centrado nas pessoas e seja capaz de corrigir injustiças históricas”, disse Gil Scatena, gerente técnico do ICLEI América do Sul, que apresentou o Evento TUMI. 

Jens Giersdorf, gerente da TUMI na GIZ, ressaltou que a mão de obra do setor de transportes no mundo é normalmente dominada pelos homens, inclusive nos cargos de liderança e tomada de decisão. Portanto, a TUMI trabalha ativamente para que a transformação tecnológica abra espaço para novos empregos para as mulheres. Além disso, há dois anos o governo federal alemão publicou uma política feminista de cooperação e política exterior. 

Em Montevideo, no Uruguai, uma empresa operadora de ônibus elétrico fez uma parceria com um órgão local, equivalente ao Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) do Brasil, para formar mulheres mecânicas especializadas em veículos elétricos.

Em Sorocaba, no interior de São Paulo, a maioria das mulheres no setor de transportes perdeu o emprego quando o cargo de cobradora foi substituído por totem eletrônico de pagamento junto às catracas. Por influência sindical, a cidade criou o cargo de agente de bordo, no qual hoje 76% dos ocupantes são mulheres. 

Outros projetos

Ainda no âmbito da Iniciativa Transformadora de Mobilidade Urbana (TUMI), outro projeto bem sucedido é o RECICLO, que substituiu carrinhos de mão de catadores em Fortaleza, no Ceará, por triciclos elétricos. A solução de logística reversa urbana dá mais dignidade e eficiência aos trabalhadores e trabalhadoras responsáveis por coletar 90% dos resíduos sólidos recicláveis do país. 

Nos últimos 10 anos, a malha cicloviária de Fortaleza cresceu de 70 km para mais de 400 km, tornando viável o uso dos triciclos elétricos por catadores e catadoras de materiais recicláveis. A coleta ocorre de porta a porta atualmente em 10 bairros. Moradores fazem o agendamento da retirada dos resíduos por meio de um aplicativo, e os profissionais recolhem, fazem a contagem, pesagem e destinam os resíduos para a infraestrutura de reciclagem. 

Crédito das fotos: Brazuca / ICLEI World Secretariat

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