Waldirene Sawozuk Bellardo (*)
A presença de aparelhos celulares nas escolas brasileiras, indubitavelmente, tornou-se um problema de grande envergadura. Portanto, exige uma solução. Uma grande dúvida está na construção da resposta que está sendo elaborada para esse problema. Será que a aprovação de uma lei proibindo ou restringindo o uso de aparelhos celulares nas escolas é a melhor saída?
Na minha opinião parece ser a opção mais fácil, porém a que atingirá apenas superficialmente um fato que é bem mais complexo: a onipresença de telas conectadas digitalmente em todas as dimensões da vida contemporânea e em todos os setores da sociedade.
Ademais, a aprovação de uma lei sempre traz consigo desafios relacionados ao seu processo de implementação. Para citar apenas um deles, de acordo com dados do Censo Escolar (2023), temos mais de 178 mil escolas no Brasil, abarcando diferentes etapas (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio); diferentes modalidades (EJA, EaD, Educação Profissional, Especial, Quilombola, Campo…); diferentes dependências administrativas (município, estado, união); públicas, privadas e confessionais; pequenas, médias e de grande porte. Conseguirá uma lei sensibilidade suficiente para representar as necessidades e especificidades de toda essa diversidade de instituições escolares?
O que está em “xeque”, parece, não é apenas a presença de aparelhos celulares nas escolas, mas a permanência de um modelo de ensino que remonta o final do século XIX e que não contempla mais uma sociedade que passou, parafraseando o filósofo francês Michel Serres, por uma revolução digital. Ou seja, o conflito inerente ao uso de celulares nas escolas é apenas um sintoma de um problema maior que deve ser debatido com rigor e responsabilidade por toda a sociedade: o fim de um determinado modelo de ensino.
Transformar dados coletados livremente na internet, por meio de aparelhos celulares, em informações e conhecimento envolve um trabalho complexo, deliberado, cooperativo, reflexivo e dialógico entre os estudantes e entre estes e o professor – responsável por ampliar o repertório dos alunos e ajudá-los na construção de sua cidadania digital. Não será proibindo o uso de celulares nas escolas que combateremos a desinformação e a fake nNews, que transformaremos dados em informação e conhecimento, que ampliaremos as oportunidades de aprendizagens significativas.
Contudo, um ensino baseado na cooperação e no diálogo, na construção da autonomia intelectual do estudante e da sua cidadania digital, sustentado em metodologias ativas, em pesquisa e criação, não acontecerá em espaços que os alunos permanecem enfileirados e cuja principal atribuição é ouvir passivamente e dar as respostas certas. Para esse modelo, a proibição do uso de celulares é tarefa urgente.
Assim como o pomo da discórdia deu origem à queda de Troia, que o debate acerca do uso de celulares nas escolas possa também fomentar a queda de um determinado modelo escolar. Afinal, as novas gerações devem ser educadas para o seu tempo.
(*) Waldirene Sawozuk Bellardo é graduada em Pedagogia com especialização em Organização do Trabalho Pedagógico. Mestrado em Educação e Doutorado em Políticas Educacionais. Professora Dr.ª do Centro Universitário Internacional – UNINTER.
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