Integração entre radioterapia e imunoterapia aponta avanços em terapias oncológicas

by Amarildo Castro
  • Combinação estimula sistema imunológico a reconhecer tumores resistentes, mas dose e ‘timing’ ideais seguem indefinidos para cada tipo de câncer

Foto: Freepik

A combinação dos tratamentos de radioterapia e imunoterapia é avaliada como uma alternativa promissora no combate ao câncer, especialmente no caso de tumores antes considerados de difícil controle. Pesquisas internacionais indicam que a técnica, conhecida como radioimunoterapia, tem potencial para transformar tumores “invisíveis” ao sistema de defesa em alvos reconhecíveis e vulneráveis.

A ausência de protocolos padronizados ainda impede que a imunoterapia alcance seu potencial máximo: faltam definições sobre dosagens e cronogramas de aplicação específicos para cada tipo de tumor.

Sozinha, a radiação elimina células cancerosas no local tratado e também pode estimular o sistema imunológico a atacar a doença em diferentes partes do corpo, conforme mostram essas pesquisas. Esse fenômeno é conhecido como efeito abscopal. O tratamento oncológico por radioimunoterapia funcionaria em duas frentes: quando a radioterapia destrói células tumorais, ela libera marcadores que identificam o tumor e sinais de alerta que ativam células de defesa especializadas do organismo. Paralelamente, os medicamentos imunoterápicos bloqueariam os “truques” que as células cancerosas usam para se esconder do sistema imunológico.

Ensaio clínico revela sobrevida maior em tumores de pulmão metastático

O ensaio clínico PEMBRO-RT, conduzido por pesquisadores da Johns Hopkins University School of Medicine e do Netherlands Cancer Institute, analisou 293 amostras coletadas de 92 pacientes com câncer de pulmão metastático. 

Os resultados mostraram que, quando receberam radioimunoterapia, pacientes com tumores “frios” – com baixa presença de células de defesa -, sem expressão da proteína do sistema imunológico PDL1 ou com mutações genéticas específicas tiveram uma sobrevida mais longa, sem progressão da doença. O tratamento induziu o efeito abscopal sistêmico, ativando respostas imunes em áreas tumorais que não foram diretamente irradiadas.

Outro estudo, realizado pela University of Chicago, publicado em 2022, demonstrou que pacientes com alto grau de instabilidade genômica, condição associada a respostas fracas aos tratamentos imunológicos isolados, apresentaram benefícios com a combinação.

Já pesquisadores do Institute of Cancer Research identificaram que a radioterapia pode aumentar a expressão de uma enzima chamada ART1 nas células malignas, o que interfere na função das células de defesa. Essa descoberta aponta novos alvos terapêuticos para potencializar ainda mais a eficácia da combinação. 

Resultados em outros tipos de câncer

Entre os principais fatores de risco do câncer de mama triplo-negativo, subtipo agressivo que não responde a terapias hormonais tradicionais, estão as mutações em BRCA1, mais comum em mulheres jovens e negras. Com foco nesse tipo de câncer, os pesquisadores da Weill Cornell Medicine desenvolveram uma abordagem combinando radioterapia com dois tipos de imunoterapia. 

O trabalho, publicado em 2023, utilizou modelos experimentais e demonstrou regressão tumoral completa ou quase completa. A equipe planeja testar a combinação em pacientes com doença metastática.

Para tumores gastrointestinais, a equipe da pesquisadora Laurence Zitvogel, do instituto francês Gustave Roussy, apresentou evidências sobre como a radiação intestinal de baixa dose, combinada com outros tratamentos, modula a flora intestinal e melhora a infiltração de células de defesa no tumor pancreático metastático. O estudo, publicado em 2025, abre caminho para novas estratégias em um dos cânceres mais desafiadores.

Trabalhos dos pesquisadores liderados por Encouse Golden, da Weill Cornell Medicine, levaram aos ensaios clínicos PANTHER e ARC-9, que testam bloqueadores de uma substância chamada adenosina combinados com radioterapia em câncer colorretal metastático. Em câncer de próstata, pesquisadores identificaram que as principais finalidades da radioterapia são potencializadas com dose específica de 12 Gy, que maximiza a infiltração de células de defesa, com resultado quatro vezes superior à imunoterapia isolada.

Em tumores de cabeça e pescoço recorrentes, um regime combinado de radioterapia, quimioterapia e imunoterapia alcançou taxa de resposta de 70% e controle da doença em 100% dos casos, segundo relato publicado em 2023. Em casos de glioblastoma (tumor cerebral agressivo), o ensaio STERIMGLI demonstrou que a combinação foi bem tolerada e apresentou eficácia promissora.

Especialistas alertam para efeitos colaterais e necessidade de mais estudos

A radioterapia pode causar linfopenia radioinduzida, diminuição da contagem de linfócitos circulantes que prejudica a função imune sistêmica e está associada a pior sobrevida. Estudos do pesquisador Ralph Weichselbaum, publicados na revista Nature, identificaram que a radioterapia pode promover metástases através do aumento de Amphiregulin, proteína associada a piores resultados. Amphiregulin e radiação aumentam a expressão de CD47 nas células tumorais, o que impede macrófagos de “engolir” células cancerosas.

A terapia combinada também pode aumentar o risco de eventos adversos relacionados ao sistema imunológico, como pneumonite, hepatite e colite. Questões sobre o melhor momento para combinar as terapias, o intervalo ideal entre aplicações e a dose de radiação mais eficaz para cada tipo de tumor permanecem sem resposta definitiva. Instituições internacionais conduzem estudos de fase 2 e 3 para preencher essas lacunas.

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